A maternidade é uma coisa que me assusta, desde o momento da gravidez até o momento em que existe uma pessoa, já grande, com seus próprios valores e opiniões, e você fica se perguntando se você ainda reconhece aquela pessoa. No entanto, ao ler uma narrativa sobre adolescentes grávidas e bruxaria, não imaginei que poderia acabar tendo sentimentos tão ternos em relação à maternidade e tudo que a engloba.
Witchcraft for Wayward Girls (Grady Hendrix) se passa em 1975, em uma daquelas maternidades na qual adolescentes eram enviadas quando ficavam grávidas e seus pais contavam a todos que a filha apenas estava cuidando de uma tia doente ou que estava em uma colônia de férias para que ninguém soubesse a vergonha que era a jovem mulher estar gestando uma nova vida sem ser casada. A ideia dessas maternidades era manter a gravidez escondida, auxiliar no parto e garantir que o bebê fosse levado para adoção o quanto antes, para que a menina pudesse retornar a sua vida “normal” o mais rápido possível.
Neste livro, acompanhamos a história de Nova, que na maternidade recebe o nome de Fern (todas as meninas lá recebem um pseudônimo, pois ninguém deve trocar informações pessoais com ninguém, e ninguém pode saber que elas estiveram lá), quando ela é enviada para lá após engravidar do seu namoradinho aos 15 anos de idade.
Lá, ela faz amizade com Rose, que faz aquele papel de adolescente revoltada com o sistema e com o patriarcado, com Holly, uma menina ainda mais nova que ela e aparentemente muda, e Zinnia, uma menina negra que era tratada diferente das outras por conta do racismo da época (que era mais institucionalizado do que hoje em dia). Juntas, elas recebem de uma bibliotecária ambulante um livro que as ensina magia, tornando-as bruxas para se voltarem contra a maternidade da Senhorita Wellwood e todo o sistema no qual estão inseridas.
Nem todas as meninas da casa querem abrir mão de seus bebês e algumas carregam traumas pesados que fazem com que as meninas criem uma relação de cumplicidade entre elas enquanto navegam esse momento extremamente delicado longe de tudo e todos. O livro toca em temas como a força do desejo das meninas e qual o preço que elas aceitam pagar para conseguir aquilo que querem ou precisam.
Apesar de ser um livro escrito por um homem sem filhos (como ele mesmo diz na parte de acknowledgements), é nítido o quanto ele foi bem amparado por pessoas ao seu redor para que ele escrevesse uma obra respeitosa. Além disso, uma coisa que eu adorei é que a magia usada no livro não é uma sistema mágico inventado simplesmente para os propósitos fantásticos do livro. Os rituais que as meninas fazem tem sim uma base real, mostrando que o autor estudou magia de fato antes de escrever esse livro, embora ainda haja elementos fantásticos (como bruxas voando, por exemplo).
Fazia algum tempinho que uma leitura não me sugava desse jeito e estou imensamente feliz de ter dado uma chance para este livro (admito que o que mais me chamou a atenção foi a palavra “witchcraft” e a capa). Já tinha visto que ele tem sido muito bem falado, mas isso não quer dizer muita coisa porque conheço muitos livros bem falados que, pra mim, não foram nada demais, risos. No entanto, como disse, tive sentimentos bastante ternos pelas meninas e pelos seus desejos de manter os bebês, de impedir que esse sistema perverso se perpetuasse.
Devo admitir que não gostei muito da personagem principal, a Nova/Fern. Achei ela meio tontinha, meio sem personalidade, meio só indo com a maré grande parte do tempo, e até um pouco antes do final do livro achei ela uma baita de uma covarde. Felizmente há mudanças, mas até chegar nelas eu torcia imensamente pra que ela fosse pega pela antagonista.
Uma coisa que foi interessante na minha experiência de leitura é que li narrativas de partos enquanto eu mesma estava sofrendo de cólicas menstruais, então eu senti uma certa imersão, ainda que em menor escola e não muito agradável, risos.
Atualmente, o livro não possui tradução para o português, mas já vi que o autor tem algumas obras traduzidas (O Exorcismo da Minha Melhor Amiga e Como Vender uma Casa Assombrada), então fico no aguardo de alguma editora licenciar a obra por aqui.
Que resenha incrível! Você conseguiu transmitir não só a premissa do livro, mas também toda a carga emocional que ele traz, e isso me deixou super curiosa para conhecê-lo.
ResponderExcluirAchei muito interessante como o autor pesquisou magia real para incorporar na história, isso sempre dá um toque especial à narrativa. Espero que o livro seja traduzido logo, afinal meu inglês não é lá dos melhores e eu realmente fiquei interessada no livro. Adorei o jeito como você compartilhou suas impressões de forma tão sincera e envolvente!
Até breve!
Beijos ~
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